segunda-feira, 30 de março de 2009

Gosto não

Não gosto de sentir a pele arder quando queimada de sol. Do cheiro de suor quando seco nas roupas. De pegar um produto na prateleira do supermercado quando está sem preço. Daquela dor fina debaixo das costelas quando respiro errado. De sentir o peso de um resfriado sobre os olhos. De ter que brigar. De evitar uma briga. De ligar para alguém e ninguém atender do outro lado. De quando minhas roupas ficam gastas. De quebrar copos. Das noites de domingo depois das 21:30. De quebrar a unha. De segurar o xixi. De morder o palito de sorvete. De bater o dedinho do pé. De me sentir sozinha. De café frio. De picada de mosquito. De esperar. De sentir o arder da pele sob o dedo quando a unha levanta. De acordar com os olhos inchados depois de chorar durante a noite. De conversar com pessoas vazias de espírito. De ficar de pé na fila do banco até o último osso da coluna doer. De desmaiar. De decorar textos. De fazer conta de divisão. Da marca que fica sobre o banco quando eu suo. Dos mosquitos que tentam me acordar durante a noite. De beliscão. De esconder sentimentos. De quando saem espinhas dentro do nariz. De assistir a uma missa ou culto. De pressa. De ver o meu sangue saindo na seringa. De espinha sem ponta. De morder a bochecha. De quando o computador trava. Da dor que fica no couro cabeludo quando solto o cabelo que ficou preso o dia inteiro. De mentiras e de ter que mentir. De aftas. De toalha molhada sobre o travesseiro. De cheiro de cachorro molhado. De levar susto quando a bexiga estoura enquanto assopro. De mal hálito. De crianças com meleca seca no nariz. Que mexam no meu umbigo. De roupas com propagandas e me sentir um outdoor. De pano de prato novo. De perder o saltinho do sapato. De ver minha mãe chorar. De atitudes sem explicação. De quando quebra a ponta do lápis.

Gosto mais

Ainda gosto de lamber a camada espessa que fica na tampinha do iogurte. De amassar os últimos grãos de arroz do prato até que entrem pelos vãos dos dentes do garfo. De cortar as pontas dos cabelos quando fico irritada. De estralar os dedos dos pés antes de pôr os sapatos. De sentir os pequenos chumaços de cabelo deslizando entre meus dedos enquanto estou impaciente e pensativa. De espirrar pelo menos três vezes todas as manhãs ao acordar. De estralar os ossos das costas ao deitar. De chorar o choro contido quando vejo alguém chorando, de compartilhar a dor que não sinto. De rir quando lembro das quedas no pátio da escola ou no meio da sala de aula. Gosto de ver a tolha passando e levando as gotas de água que ficam sobre a minha pele depois do banho. De tentar entender as pessoas pelo modo de vestir, andar, falar e escrever. De cansar de mim e pegar no sono. De me perder no excesso de informação das lojas de R$ 1,99. De espirrar com o cheiro de naftalina do guarda-roupa da minha avó. De ver o desenho do tronco das árvores a procura da luz do sol. De ficar pensando sobre o pensamento que os animais podem ter. De ver os olhos brilhantes de uma criança, aquele brilho de quem ainda se facina com o mundo. Das dobras do rosto da minha avó. De ouvi-la cantar. Da sensação do pano frio e molhado em minha testa quando tenho febre. Das linhas que ficam desenhadas no céu quando passa um avião. Das ruas coloridas quando caem as flores das árvores. De pisar em folhas secas. De correr atrás das pombas. Da dor que ficam nos músculos depois de um dia de muito exercício. De ficar sozinha. De ficar descalça. De sapatos coloridos. De observar a tartaruga. De poder chorar até soluçar. De dormir de coberta. De cochilar no sofá. De ler no metrô. De dormir enquanto o carro balança. De chorar num filme triste. De chorar de tanto rir. De comer flocos de coco doce. De achar dinheiro no bolso do casaco. De pipoca vermelha doce, aquelas que ficam grudadas. De arrancar lascas de tinta seca da parede. De raspar e lamber o brigadeiro que fica grudado na panela. De alho frito. De puxar os fiozinhos da banana quando a descasco. De observar a manteiga derreter sobre o pão quente. De ver a água secando quando se faz um castelo com pingos de areia da praia. De ouvir histórias de vida. De joaninhas e tatu-bola. De ver a lagartixa comendo mosquitos. De assistir desenhos. De sorvete de flocos. De chocolate amargo. De dar susto no gato. De arrancar casquinhas secas dos machucados. De tirar o sutiã. De me equilibrar na beirada da calçada. De imaginar como é sentir frio num dia em que está calor. De imaginar como é sentir calor num dia em que está frio.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Traço

É compreensível por mais que não aceite, mas prefiro as pessoas como pessoas à pessoas como outras.

Gosto de pessoas que mostrem que são humanas na expressão de sentimentos sejam eles felizes, tristes ou indiferentes.

Gosto de ouvir histórias de vida e não saber a moral da história. De ver os olhos brilharem, de observar os lábios se mexerem e as marcas do rosto traçar linhas.

De ver a combinação de tamanhos e cores a cada dia na escolha para se mostrar ao mundo, o modo de posicionar os fios de cabelo, em que perna apóia mais o peso do corpo que carrega. Os braços que andam soltos ou presos nos bolsos.

Pessoas que emitem personalidade e opinião, não pessoas que alimentam ser o reflexo da sociedade, de um ícone, um ídolo. A poesia está na composição, na criação, na sensibilidade da escolha, não no resultado final.

Cada pessoa uma história por mais que se enganem ser o outro. Não se escolhe, se é. É o caminho quem nos torna e não nós que tornamos o caminho. A vida nos faz, inesperadamente, por mais que escolhamos quem seremos na vida.

A imagem é só um reflexo que permite a admiração, como uma orquídea florescendo, não se é a flor, mas a análise que se faz sobre a beleza, força, crescimento, cor e delicadeza.

segunda-feira, 2 de março de 2009

O ser extremo

Toda negação possui em sua essência, a existência de sua afirmação.

O extremismo, a opinião do extremo, nada mais é do que a forma traumática do conhecimento da não-afirmação é a negação e a incapacidade da aceitação.

O não conhecimento da causa produz uma incansável busca de sua solução até atingir o seu significado, mas não a sua aceitação. Ao mesmo tempo em que a negação da possibilidade, ou seja, a sua não aceitação, produz o extremismo.

Não há como se defender a negação, defender sem a possibilidade de permitir o conhecer, pois este só afirmará a existência da situação traumática ou a discordância da idéia de fato.

Quando nega-se o aceitar das diferenças, nega-se a aceitação do ser como formador de conhecimento e pensamento, o que torna-se incoerente com a defesa do extremismo.

O crescimento do ser como produtor de idéias está na situação harmônica e não na afirmação da existência da problemática.

O ser extremo desconhece os valores humanos, fixado somente nos fatos racionais, focado na sua fundamentação, incapaz de valorizar a própria consciência como ser dimensional.
Torna-se incansável então, a busca pela auto-afirmação, pela defesa da negação e do extremismo.

Não há como almejar a vitória sem conhecer as capacidades do adversário e suas razões.

A sabedoria não é adquirida, mas sim construída e cultivada.