quinta-feira, 6 de maio de 2010

Pendurado

Agora vejo o mundo emoldurado.
Vejo em detalhes as imagens fragmentadas, que nem sempre são coloridas.

Agora vejo a moldura exposta que protege o desenho.
Vejo o homem velho que chora de emoção no desenho do desejo.

Agora vejo o sentimento representado e sinto o peso da moldura.
Vejo o medo da responsabilidade das pessoas que conversam na representação.

Agora vejo a impaciência da falsa experiência.
Vejo conversas e ouço os falsos brilhos dessa composição.

Ninguém

Eu respondo:
-Sou ninguém.

Hoje consigo ver no que me tornei. Virei àquilo que era antes de ser ninguém.

Sou a imagem, a continuação de uma história que se fez, que se sonhou num outro alguém que hoje não é mais ninguém.

Sinto orgulho do ninguém que me tornei. Do orgulho do alguém que não me conheceu, mas que me moldou.

Acho graça da imagem que se faz da imagem que represento. Sou ninguém. Repito.

Não, não é uma luta, é a construção. É a unidade na multiplicidade, ou o seu oposto.

Há de ser nada, ou nada ser.

Lamento por não conseguir ver o ninguém que sou.

Não sou a velha história, faço parte, somente, da trajetória.

Deixe somente comigo o orgulho do que não fui.

Tenho a pele morena da mistura que se fez, sou a mutação.

Gosto quando me olha, mas sei que não me vê. Enxergas somente o alguém que não sou. Não consigo sentir que entende o ninguém que sou.

Faz parte do show os risos, as lágrimas e os aplausos, mas é só mais um show.

Sou somente ninguém.