Descrevo.
Um instante que fotografo com a caneta prateada e com detalhes em cor-de-rosa.
A cama fica aos pés da janela de venezianas que parece fazer questão em exibir a luz do dia que ilumina a pele do meu joelho.
Nas paredes brancas, nenhum quadro, somente desenhos feitos com os movimentos do dia.
Um ventilador de teto para refrescar o corpo e um minuto sozinha para a mente.
De colorido, somente as roupas que secam dependuradas na cama ou atrás da porta.
Daqui posso ver o céu, algumas folhas da palmeira da casa do vizinho e um pedaço do telhado.
Tudo recortado em seis partes iguais, as grades me protegem do mundo de fora e me aprisionam no mundo aqui dentro.
Na segunda e na quinta divisão desse céu, dois pequenos anjos.
Macarrões dourados giram, balançam pra lá e pra cá, como se não soubessem em que mundo entrar.
Uma escolha.
Hoje almocei anjos regados a molho de tomate e carne moída.
Agora, sabendo disso parecem mais agitados na janela do quarto.
Mas assim como eu, estão presos a fios e linhas transparentes. Não há como fugir ou correr, não existe esconderijo.
A linha entrega o caminho seguido. Os anjos estão vulneráveis a ação do tempo.
Acalmaram, parecem entender o destino, aceitar a situação. Admirar da janela a chuva que amolece o corpo, desfaz a cor, o sol que resseca e quebra.